Justiça cega não combina com juiz militante
Por Vicente Crispino
A Justiça só funciona quando inspira confiança. E confiança se constrói com imparcialidade, não com fotos em jantares com políticos ou mensagens exaltando candidatos. O afastamento do desembargador Marcelo Lima Buhatem, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), é um lembrete amargo, mas necessário: a toga não pode ter lado.
Buhatem compartilhou mensagens de apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro, inclusive associando o atual presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, ao crime organizado. Isso não é liberdade de expressão, é desrespeito à Constituição Federal e à função essencial da magistratura.
A Carta de 1988 é clara. Segundo o artigo 95, inciso III, juízes estão proibidos de “manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento” e de “exercer atividade político-partidária”. A razão é simples: quem julga não pode tomar partido.
E o problema não se limita a curtidas ou postagens. Buhatem aparece em foto com Bolsonaro em Dubai, à mesa, em ambiente amistoso, como quem divide mais que uma refeição: divide afinidades, intenções, talvez até projetos. Tudo isso enquanto o ex-presidente é réu por tentativa de golpe de Estado no STF. Como confiar na neutralidade de quem posa ao lado de um acusado de atentar contra o Estado Democrático de Direito?
A defesa do desembargador alega que ele apenas “curtiu” publicações. Mas, em tempos digitais, curtidas também comunicam. E, quando vêm de um juiz, comunicam posicionamento institucional, deslegitimam decisões e fragilizam o pacto democrático.
O CNJ, por maioria, entendeu que a conduta de Buhatem comprometeu a credibilidade do Judiciário. Acertou. E até foi brando. Sessenta dias de afastamento com vencimentos proporcionais é pouco frente à gravidade do caso.
A Justiça precisa continuar cega. Não por ignorar o mundo, mas por não se deixar seduzir por ideologias, alianças ou interesses. Se os juízes abandonam a neutralidade, quem protege o cidadão do arbítrio?