Vai a sanção projeto que facilita regularização de terras na Amazônia
O Senado aprovou nesta terça-feira (21), em regime de urgência e com alterações, o substitutivo da Câmara ao Projeto de Lei (PL) 2.757/2022, que prevê a extinção de cláusulas resolutivas constantes de títulos fundiários e facilita a regularização de antigas ocupações. De autoria do senador Confúcio Moura (MDB-RO), o projeto faz ajustes na Lei do Programa Terra Legal, também conhecida como Lei da Política de Regularização Fundiária da Amazônia ou Lei da Amazônia Legal (Lei 11.952, de 2009) e também promove outros ajustes conexos com o tema nos casos de reforma agrária e de financiamento para a aquisição de imóvel rural com recursos do Fundo de Terras e da Reforma Agrária (FTRA). Aprovado em votação simbólica e relatado em Plenário pelo senador Marcelo Castro (MDB-PI), a matéria será encaminhada à sanção presidencial.
O texto extingue as condições resolutivas (que permitem a rescisão do contrato se essas condições não forem cumpridas) constantes de títulos de assentamento emitidos até 25 de junho de 2009, desde que o beneficiário tenha quitado o preço; a área total não exceda a 15 módulos fiscais; o imóvel esteja inscrito no Cadastro Ambiental Rural (CAR); e inexista exploração da mão de obra em condição análoga à de escravo na área regularizada. A extinção das condições resolutivas não afasta a responsabilização do beneficiário por eventuais infrações ambientai, trabalhistas e tributárias.
Ao ler seu relatório em Plenário, Marcelo Castro explicou a importância do projeto.
— Sobretudo na região amazônica, muitas pessoas foram assentadas, o governo federal e o Incra fizeram loteamentos e deram títulos provisórios com cláusulas resolutivas, e isso vem desde década de 1960. Muitos dos seus beneficiários já morreram e deixaram herança para seus filhos. Lá eles residem, mas não têm título definitivo da terra, não podem tomar empréstimos, vender ou dar em garantia porque todos esses contratos têm cláusulas resolutivas que já foram superadas e hoje não têm mais nenhuma significação do ponto de vista econômico e social. O próprio Incra está lutando para que essas cláusulas sejam extintas. É um projeto que vem atender ao pequeno e médio produtor rural que receberam títulos do governo federal e do Incra e que estão em situação irregular e, agora, estamos dando oportunidade de regularizar. Por isso é que nós somos de parecer favorável à aprovação da matéria — afirmou Marcelo Castro.
O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) parabenizou Confúcio Moura e defendeu a proposição.
— O projeto simplifica mais e a gente precisa titularizar, principalmente a área rural. Ninguém consegue financiamento se não tiver escritura. O objetivo é titularizar, e não especular — afirmou.
Confúcio Moura disse que o projeto “vai resolver a porta do Incra em cerca de 80% das demandas”.
— É um projeto prático, bom, eficiente, de resultado rápido, e vai atender a milhares de produtores rurais ainda pendentes de regularização fundiária. O projeto não é de esquerda nem de direita, ele é necessário e eficiente, é um projeto bom que vai atender a todos os estados — afirmou.
O senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) disse que o projeto, além de beneficiar milhares de produtores, vai regularizar suas terras e dar dignidade para essas pessoas poderem produzir com tecnologia.
O senador Jaime Bagattoli (PL-RO) afirmou que o projeto contribui para regularizar as terras de pequenos produtores não só de Rondônia, mas do Brasil inteiro, fazendo justiça no campo com quem não é proprietário de terra.
Alterações no texto
Marcelo Castro rejeitou o aumento do teto da área rural regularizável feito pela Câmara dos Deputados e, por consequência, restaurou o limite constante do texto do Senado Federal.
“O substitutivo da Câmara dos Deputados aumentou o limite máximo da área do imóvel rural de 15 módulos fiscais para 2.500 hectares no caso de extinção das cláusulas resolutivas relativas a títulos emitidos até 25 de junho de 2009. Esse aumento do teto foi motivado pelo fato de o inciso XVII do artigo 49 da Constituição Federal exigir autorização prévia do Congresso Nacional para alienação de terras públicas em tamanho superior. Entendemos, porém, que devemos rejeitar essa emenda da Câmara, porque o tamanho máximo de 15 módulos fiscais condiz com a razoabilidade. É preciso notar que esse tamanho oscilará em termos de metros quadrados ao longo do país, pois o módulo fiscal varia a depender de cada região. O foco da proposição não são as extensas áreas rurais, e sim aquelas do cidadão comum”, explica o senador em trecho de seu relatório.
O relator também promoveu ajuste redacional no projeto, trocando o termo “posse direta” pelo termo “posse plena”, a fim de adequar o texto do substitutivo à legislação em vigor.
“No parágrafo 1º projetado ao artigo 26-B da Lei da Reforma Agrária (Lei 8.629, de 1993), é absolutamente claro que a intenção do legislador é estabelecer que somente pode requerer a regularização da ocupação informal aquele que efetivamente estiver ocupando o imóvel de modo direto, sem intermediários. Acontece que, por lapso redacional, utilizou-se a expressão posse direta para se referir a essa ocupação, buscando um sentido leigo do termo. Na verdade, a intenção da proposição é que sejam beneficiados com a regularização quem, de forma direta, está ocupando o imóvel, sem emprestar ou alugar a terceiros. Essa situação jurídica é tecnicamente chamada de posse plena na técnica do direito civil. Não se quer beneficiar nem possuidores indiretos (como quem empresta o bem), nem possuidores diretos (como o amigo a quem se emprestou gratuitamente o imóvel ou um inquilino). Considerando que a legislação deve buscar utilizar a linguagem da técnica jurídica, e não o sentido semântico leigo das palavras, é imperioso realizar o ajuste redacional em pauta, o que faremos por meio de emenda de redação”, explica Marcelo Castro.
O relator destaca que o substitutivo é expresso em realçar que a liberação das condições resolutivas não é um perdão por eventuais infrações ambientais, trabalhistas e tributárias. Trata-se apenas, diz ele, do “afastamento de restrições jurídicas vazias que, na prática, acabam prejudicando toda a sociedade com a proliferação de situações de informalidade”.
“De fato, mostra-se louvável a busca pela regularização de assentamentos antigos, de mais de 14 anos atrás. Estamos a tratar de títulos de assentamento emitidos até 25 de junho de 2009. As condições resolutivas impostas aos títulos daquela época já perderam o sentido prático pelo longo transcurso do tempo. Insistir em condições resolutivas antigas como essa é, na verdade, impor uma burocracia vazia que gera (e continuará gerando) prejuízos muito maiores, como o estímulo à informalidade, péssima para a economia e para a sociedade. Dificulta a circulação de crédito e de bens. Incita novas invasões. Instiga a realização de contratos de gaveta”, conclui Marcelo Castro.
Utilização da terra
No caso de o beneficiário estar inadimplente quanto ao pagamento do preço, é assegurada a extinção das condições resolutivas quando da quitação da dívida, observados os demais requisitos legais. O Poder Executivo regulamentará condições financeiras de renegociação para essa quitação dentro dos limites da Lei da Amazônia Legal.
O texto altera a Lei da Reforma Agrária (Lei 8.629, de 1993), ao acrescentar o parágrafo 9º ao artigo 6º da norma, para garantir que os laudos de avaliação do grau de utilização da terra e do grau de eficiência na exploração sejam, a pedido do proprietário, atualizados, se já contarem com mais de cinco anos. Esses laudos são importantes para aferir se a propriedade atende ou não à função social e, portanto, está ou não sujeita à desapropriação para reforma agrária.
O substitutivo também altera o parágrafo 2º do artigo 20 da Lei da Reforma Agrária, para permitir que prestadores de serviços de interesses comunitários à comunidade rural ou à vizinhança da área possam ser beneficiados em projetos de assentamentos em programa de reforma agrária, o que inclui profissional da educação, profissional de ciências agrárias e agentes comunitários de saúde ou agente de combate às endemias.
Acrescenta ainda o artigo 20-A à referida lei, para permitir que seja contemplado no programa de reforma agrária quem, apesar de já ter sido assentado anteriormente, teve de desfazer da posse por razões sociais ou econômicas, desde que ocupe a parcela há, no mínimo, um ano. O texto veda, porém, uma terceira obtenção de terras de assentamento de reforma agrária.
Lote em assentamento
O substitutivo altera também o artigo 26-B para permitir que o Incra regulariza a posse de lote em assentamento que tenha sido ocupado sem autorização, observados os requisitos legais. Exige-se, porém, que o projeto de assentamento tenha sido criado há mais de dois anos e que o interessado esteja ocupando e explorando a parcela há, no mínimo, um ano.
Nesse caso, o requerimento de regularização deverá ser feito por quem estiver na posse direta do lote (artigo 26-B, parágrafo 1º da Lei da Reforma Agrária), sem prejuízo de poder ser feita de ofício pelo Incra.
Financiamentos a assentados
De outra parte, o substitutivo altera os incisos I e IV do artigo 3ºA da Lei 13.465, de 2017, que trata de financiamentos feitos a assentados em reforma agrária ou em regularização fundiária na Amazônia Legal.
A proposição facilita o financiamento para a aquisição de imóvel rural com recursos do Fundo de Terras e da Reforma Agrária (FTRA), aumentando o limite de crédito para financiamento para R$ 280 mil por beneficiário, autorizando financiamento de até 100% do valor dos itens financiados e esclarecendo que o limite de crédito, bem como o valor máximo da renda bruta familiar do beneficiário, será atualizado monetariamente a cada ano.
Reprodução: Agência Senado